terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

SOMOS MAQUIAVELICOS - O QUE MAQUIAVEL NOS ENSINOU SOBRE A NATUREZA HUMANA

 

Sinopse

Sem dúvida Nicolau Maquiavel é um dos pensadores mais influentes e controversos do mundo moderno. Júlio Pompeu teve seu primeiro contato com a obra do filósofo italiano nos cursos sobre política da faculdade de Direito e desde então nunca mais o deixou.O uso pejorativo do termo maquiavélico, em contraste com a eficácia dos seus conselhos, o intrigava. Maquiavel tornou-se uma obsessão - objeto de leituras intermináveis e referência obrigatória em suas aulas e textos.De fato, as lições de Maquiavel continuam pertinentes e atuais. O modo como contrariou o idealismo dominante em sua época não só é uma de suas facetas mais originais como permanece fundamental para se pensar o idealismo nos dias de hoje. Maquiavel alerta, sem piedade: os homens, se não lutam por necessidade, lutam por ambição. O homem é o que é, e a política expressa tanto suas virtudes quanto seus vícios."O que dificulta o entendimento das ideias de Maquiavel é a "feiura" da verdade sobre a natureza humana. É preciso encará-la e ultrapassá-la. Mas para isto, antes, devemos perceber que agimos de uma maneira e fingimos agir de outra. Que somos uma coisa e imaginamos ser outra. Não por hipocrisia, ou qualquer outro defeito, mas por fraqueza. Somos fracos demais para admitir, para nós mesmos e para os outros, que agimos movidos por desejos egoístas, que mesmo nosso altruísmo talvez seja somente um egoísmo disfarçado de boas intenções. Desta fraqueza sem franqueza nasceu uma imagem mentirosa de nós mesmos.", escreve o autor na introdução do livro.O texto de Júlio Pompeu é direto e franco. Apresenta a filosofia política de Maquiavel sem maiores complicações, resgatando sua importância e atualidade. Mostra ao leitor que, apesar de todo o tempo transcorrido desde os dias de Maquiavel, ainda somos maquiavélicos.

Ficha Técnica

Editora: OBJETIVA
ISBN: 8539001799
ISBN13: 9788539001798
Edição: 1ª Edição - 2011
Número de Páginas: 256
Acabamento: BROCHURA
Formato: 14,00 x 21,00 cm.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O criador e a criatura

Quem leu meu artigo "A Vassoura de Dilma", de três semanas atrás, não foi surpreendido pelas análises da semana passada, elogiando o desempenho da presidente. O que surpreende é que muitos petistas estejam magoados com os chamados formadores de opinião que estão aprovando o estilo Dilma de governar. A questão é que é inevitável a comparação entre a criatura e o criador. Em bases não populistas, de seriedade política, a criatura sai ganhando até agora. A comparação não é maldosa. Sempre se compara o sucessor com o antecessor, como os petistas tanto fizeram em relação a Lula e FHC.
No aniversário do PT, Lula foi acometido de uma catarse, um desabafo: "Se a grande ofensa e a grande desconstrução do governo Lula que eles querem fazer é falar bem da Dilma, eu morrerei tranquilamente feliz. Morrerei tranquilamente porque era esse o nosso objetivo, era eleger alguém que pudesse fazer mais e melhor. Porque se fosse pra fazer o mesmo eu teria pleiteado o terceiro mandato", disse o ex. Imaginem se seria fácil rasgar a Constituição e pleitear terceiro mandato. Além disso, ninguém sugeriu que falar bem de Dilma fosse para desconstruir Lula. Passou recibo.
Ele estava bem zangado: "O que a gente percebe é que essa gente metida a ser informadora de opinião pública não entende nada de psicologia. Porque a minha relação política com a Dilma é indissociável, nos bons e nos maus momentos." Parece que a psicologia está em revelar algum tipo de ciúme do criador em relação à criatura. Enfim, vá lá; tomara que não seja nada disso, porque seria uma loucura o PT faltar a Dilma o necessário apoio para que ela faça o que é preciso fazer, como cortar a gastança e desagradar o fisiologismo do aliado PMDB.
O que pode preocupar os brasileiros é que o PT, acostumado a gestos populistas e bravatas, esteja sentindo falta do Ibope dos anos passados e queira pressionar a presidente para a volta da demagogia gastadora e geradora de bons índices de aprovação. Dilma certamente leu Maquiavel (sim, a presidente lê) e sabe do conselho de fazer todo o mal de uma vez e logo no início do governo. E Lula bem que poderia focar-se no mérito dele de ter descoberto Dilma e ter elegido Dilma. E passar a aplaudir os acertos de Dilma junto com "essa gente metida a informadora de opinião pública".

Alexandre Garcia é jornalista em Brasília e escreve em A Gazeta às terças-feiras. E-mail: alexgar@terra.com.br
 

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Cláudio Couto: O jogo duro de Dilma

por Cláudio Gonçalves Couto*, em Valor
O pioneiro de todos os cientistas políticos, Nicolau Maquiavel, ensinava aos príncipes (com base no que fizeram outros príncipes, bem sucedidos), que o mal se faz de uma vez e o bem aos poucos. Transposto à vida democrática contemporânea, esse ensinamento sugere aos governantes que tomem as medidas mais duras e de difícil implantação no início de seus mandatos, quando ainda dispõem de uma considerável reserva política de paciência e expectativa. A paciência e a expectativa não se distribuem da mesma forma e nem significam a mesma coisa para os cidadãos e os políticos – ou, nos termos de Maquiavel, o povo e os poderosos.

Para os primeiros, a expectativa decorre da esperança de que um novo governante consiga atender aos anseios que tornaram possível a sua eleição. Mesmo aqueles que não votaram nesse governante costumam alimentar a esperança de que sua gestão contrarie a avaliação negativa feita por ocasião das eleições, revelando-se uma grata surpresa. Já os que votaram no candidato vitorioso alimentam uma esperança ainda maior, decorrente de sua natural simpatia prévia. Tanto num caso como no outro é de se esperar que os cidadãos deem ao novo governante um tempo para demonstrar que suas políticas surtirão efeito e que as expectativas positivas não eram em vão – é aí que se revela a paciência dos cidadãos em relação aos novos governantes. Até mesmo o presidente Fernando Collor, quando confiscou as poupanças dos cidadãos, contou com paciência e expectativas positivas de uma larga parcela da população. Os governados torciam para que aquela medida surtisse efeitos positivos, apesar de ser tão drástica. Por isto, pacientemente aguardaram. Ao fim e ao cabo, aquele mal de uma vez só plantado mostrou-se somente um mal, sem que fosse possível colher gradualmente os benefícios que pudesse ter gerado. A perda de popularidade do presidente foi inevitável.

Para os políticos, a expectativa e a paciência têm a ver com seus cálculos prospectivos de sobrevivência e ganho político durante todo o período de mandato do novo governante. A ninguém serve – sobretudo a quem não sabe o que fazer na oposição – inviabilizar um governo do qual fará parte, nem indispor-se precocemente com o novo mandatário mor. É preciso ter paciência para colher paulatinamente os frutos do sucesso de uma administração vitoriosa, assim como manter ativos os canais que permitem um bom relacionamento com a chefia do governo. Por isto, políticos matreiros evitam bater de frente com o novo chefe de governo logo de início, apostando em ganhos diferidos no tempo. Ou seja, é preciso ter paciência e não perder as esperanças. Tal situação mostra-se especialmente útil aos presidentes recém-eleitos no início de seu mandato – um período que não casualmente alguns chamam de “lua de mel”. A presidente Dilma Rousseff parece ter atentado para isto, ao menos tendo em consideração duas estratégias de seu início de governo. A primeira delas diz respeito à montagem da equipe; a segunda à negociação do salário mínimo.
No atinente à montagem do novo governo, com as indicações de praxe para os cargos de livre provimento, a nova presidenta parece ter cometido um excesso e um acerto – ao menos estrategicamente. O excesso diz respeito à distribuição das pastas ministeriais para os partidos da coalizão: novamente o PT se viu sobrerrepresentado na alocação de ministros (como no primeiro governo Lula), relegando os aliados (principalmente o PMDB) a uma condição claramente subalterna. Se isto visa abrir espaço para, num segundo momento, de eventuais dificuldades ou desgaste, recompor o governo com os demais partidos, transferindo-lhes ministérios antes ocupados por petistas, pode-se entender que a estratégia é a de poupar munição para tempos difíceis. Se não for isto, está-se gerando um desgaste inicial desnecessário e se trata de um erro de cálculo.

Já o acerto evidente diz respeito às nomeações para postos no segundo e terceiro escalões. Mesmo arcando com um considerável desgaste junto aos partidos coligados – principalmente o PMDB – a presidente parece ter percebido que ou impõe certos limites à politização da máquina governamental agora, no início de seu mandato, ou não conseguirá jamais assegurar um mínimo de racionalidade à gestão de órgãos públicos que há tempos sofrem com desmandos políticos – como, notadamente, a Infraero, os Correios, a Funasa e empresas do setor elétrico. O problema é somar o custo desde necessário ajuste de órgãos de perfil nitidamente mais técnico com o desperdício de cacife político na alocação dos ministérios, onde o perfil eminentemente político do dirigente máximo faz sentido.

Já no que diz respeito à negociação do salário mínimo, a presidenta buscou o casamento da oportunidade com a necessidade. Todos sabem ser indispensável o ajuste das contas públicas neste momento, tendo em vista a aceleração inflacionária e a deterioração de nossa situação fiscal. Esta é a necessidade. Tal ajuste, contudo, dificilmente poderia ser feito a partir do ano que vem (quando ocorrem as eleições municipais) e menos ainda ao final do mandato, quando a “lua de mel” já terá passado. A oportunidade se apresentou agora e o reajuste do mínimo mostrou-se oportuno para que a nova chefe de governo apresentasse à sua base social de apoio os limites de sua flexibilidade. Tal negociação se reveste de ainda maior importância se considerarmos o quão significativo é sinalizar para a sociedade brasileira em geral, e para a classe política e a elite sindical, em particular, que acordos de longo prazo precisam ser cumpridos, sob a pena de ao não fazermos isto solaparmos o processo em curso, de aprimoramento institucional da nossa democracia. Isto, contudo, não foi levado em conta por algumas lideranças sindicais e partidárias, que veem na oportunidade de ganhos no curto prazo algo mais atraente que a construção de instituições – o que, necessariamente, leva mais tempo.

* Cláudio Gonçalves Couto é cientista político, professor da FGV-SP.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Ricardo Coutinho: tal qual O Príncipe, de Maquiavel

Estamos com pouco mais de trinta dias de mandato do governador Ricardo Coutinho e esse tempo não é suficiente para se avaliar um governo que pretende comandar a Paraíba por cerca de 1.500 dias. Mas se 30 dias significam pouco tempo diante do mandato total do governador, significaram uma eternidade, por exemplo, para os prestadores de serviço, que esperaram ansiosamente para ver o extrato bancário no início de fevereiro.

De qualquer forma, se 30 dias não são suficientes para avaliar um governo, são mais que suficientes para que se avalie, pelo menos, as tendências deste. E essas tendências, aqui na Paraíba, não foram tão boas. Se não, vejamos:

- Os policiais, que esperavam ver o aumento aprovado no final do ano passado nos contracheques de janeiro, não o viram e ainda tiveram o dissabor de ver declarações do governador de que não vai pagar o reajuste nos próximos meses;

- Este fato gerou uma grande insatisfação na tropa, que, até, já ameaça uma greve geral na corporação, o que pode ensejar problemas pela frente;

- Os prestadores de serviço, que começaram o ano supondo permanecer no cargo, passaram a conviver com o fantasma da demissão. Restou a expectativa individual de que cada um fosse esquecido pelo governo e, ao fim, figurasse na Folha de Pagamento. Triste engano;

- Os que têm gratificações no Estado – e aí não quero entrar no mérito destas gratificações, se foram conquistadas por mérito ou não – começaram o ano com expectativa similar à dos prestadores de serviço. Depois, com o anúncio do corte, ficaram na expectativa de ser esquecidos também. Idem, triste engano;

- Os servidores que pertencem a prefeituras e outros órgãos, colocados à disposição do Estado – muitos deles, inclusive, passaram a campanha estampando um girassol no peito e um ‘mamulengo 40’, como diria o colega jornalista Paulo Roberto, no vidro do carro – foram devolvidos em uma só canetada, logo no dia 1.º de janeiro, sem tempo para uma mínima preparação (gente com cerca de 20 anos morando em outra cidade teve que fazer o caminho de volta de um dia para o outro);

- A devolução dos servidores, por tabela, provocou problemas em vários setores da administração, sobretudo na Saúde e na Educação. Escolas ficaram comprometidas por falta de pessoal, a exemplo da Escola de Áudio Comunicação Demóstenes Cunha Lima, em Campina Grande; e dos Homocentros e Hemonúcleos do Estado;

- A Paraíba viu, talvez, a maior reviravolta nos meios de comunicação que já se pôde observar, com demissão e afastamento de jornalistas de órgãos, substituição em outros e mudanças de postura;

- Os paraibanos viram um duro aumento em todos os índices de violência – só para citar alguns, eis os dados da Associação Brasileira de Consultores Profissionais referentes ao mês de janeiro, na Paraíba: 10 bancos assaltados com uso de bombas, num aumento de 280% em relação ao mesmo mês do ano passado; 19 roubos do tipo "saidinha de banco", um aumento de 78% em relação a janeiro de 2010; 66 assassinatos, com aumento de 48% em relação ao mesmo período; 380 roubos e furtos, num aumento de 192%; 14 sequestros-relâmpago (88% a mais que em janeiro passado) e 65 assaltos às agências dos Correios e a outros estabelecimentos, 120% a mais que no ano anterior;

- A decretação do fim dos apoios para eventos turísticos em todo o Estado gerou uma ameaça para vários deles, com destaque para o Folia de Rua, com o desfile do Bloco Muriçocas do Miramar; o Maior São João do Mundo, o Encontro Para a Nova Consciência, o Encontro Para a Consciência Cristã (o maior encontro evangélico do Nordeste), dentre outros;

- A criação de mais imposto (como a tal Taxa de Inspeção Veicular que deverá ser paga, anualmente, a partir de agora, no momento do emplacamento dos veículos) e o aumento de tarifas como a de água, da Cagepa, por exemplo;

- E muito mais...

Porém, o mais extraordinário é que, se o governo não está bem avaliado nestes primeiros trinta dias, o governador passa ao largo disso tudo. E sabem por quê? Porque, na mídia, não há queixas em demasia. E estas queixas não ocorrem porque os prejudicados ainda sonham em reverter as situações. É aquela velha história: ‘vou ficar calado pra ver se, comigo, a coisa muda’.

Não sei até quando essa ‘blindagem branca’ vai continuar mantendo a imagem do governador intacta. Só sei que Ricardo não deve abusar do tempo, mesmo imaginando, eu, ter Ricardo adotado a máxima extraída do livro ‘O Príncipe’, escrito por Nicolau Maquiavel em 1513 e publicado quase 20 anos depois mas, até hoje, tão atual. Veja:

“Por isso é de notar-se que, ao ocupar um Estado, deve o conquistador exercer todas aquelas ofensas que se lhe tornem necessárias, fazendo-as todas a um tempo só para não precisar renová-las a cada dia e poder, assim, dar segurança aos homens e conquistá-los com benefícios (...) Portanto, as ofensas devem ser feitas todas de uma só vez, a fim de que, pouco degustadas, ofendam menos, ao passo que os benefícios devem ser feitos aos poucos, para que sejam melhor apreciados (...) Faça o mal de uma vez e o bem aos poucos. O conquistador deve examinar todas as ofensas que precisa fazer, para perpetuá-las todas de uma só vez e não ter que renová-las todos os dias. Não as repetindo, pode incutir confiança nos homens e ganhar seu apoio através de benefícios”.

Mas será que ainda existe mal a ser feito, além do que já foi engendrado no mês de janeiro? Queira Deus que não...
Fonte:Pbagora

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Humor e vergonha em família

Há uma vertente cômica que se apoia na evidência, naquilo que todo mundo já sabe, mas gosta de ouvir mais uma vez para sentir-se mais seguro, para compartilhar por meio da representação a certeza de alguma coisa. Foi imenso o esforço do pensamento e da prática científica do século passado para combater as restrições impostas pela civilização à liberdade amorosa e sexual da espécie humana e, embora no plano concreto ainda haja muito por fazer, o enunciado libertário é uma constante no diálogo cotidiano e nos meios de comunicação de massa. Hoje quase não há quem não saiba que afeto e sexualidade se entrelaçam e esse truísmo reconhecido há pouco pela cultura laica ocidental empresta à satisfação do corpo o revestimento digno da felicidade corporal.
Leonardo Soares/AE
Leonardo Soares/AE
Afeto e sexualidade. Peça do canadense Galluccio põe foco em família tradicional de origem italiana cujo filho se revela gay
A singela alegria de brincar com a liberdade relativamente nova e rememorar os percalços da repressão ainda vividos e doloridos na memória formam o lado mais simpático de Mambo Italiano, peça do autor canadense Steve Galluccio. Um adulto de ascendência italiana que resolve comunicar aos velhos pais a homossexualidade e a união estável com um rapaz da vizinhança e da mesma origem étnica é o ponto de partida para explorar o conservadorismo das organizações familiares tradicionais. Vergonha e escândalo nas famílias, agitação e apaziguamento resignado ao final são os componentes usuais dessa vertente cômica.
É também uma característica da comédia que deseja ser popular não enfiar a mão em cumbuca. Se o enunciado da liberdade sexual é garantia de alguns direitos no plano institucional, o meio de cultura das interdições e de tabus quase invencíveis é a família patriarcal - seja ela de origem latina ou anglo- saxônica. Esta, sim, fincada na propriedade, é aliada natural do pensamento conservador porque depende da transmissão de valores para ampliar e, pelo menos no plano ideal, perpetuar as posses. É, enfim, a família a mais temível adversária dos comportamentos amorosos e sexuais divergentes e a comédia clássica, desde Maquiavel, reconhece essa potência e analisa-a criticamente.
Sobre o tema família, contudo, a peça de Galluccio resvala com a leveza calculada por autores despretensiosos. Os pais de origem italiana da peça são escandalosos a ponto de propiciar uma máscara cômica convencional, mas estão legitimados pelo afeto igualmente escandaloso que dedicam aos seus rebentos. Em um passado remoto, para a própria geração foram efetivamente inclementes com seus preconceitos e exagerados no autoritarismo protetor, mas, no contexto da trama, são capazes de virar a mesa.
Além de aceitar a homossexualidade do filho, incluem na crise renovadora o reconhecimento dos erros do passado. Enfim, as boas intenções superam no presente os preconceitos e o hábito de imobilizar os rebentos adultos com a excessiva proteção do lar paterno.
Não há no texto matéria densa suficiente para alimentar pretensões criativas e o espetáculo dirigido por Clarisse Abujamra trata com simplicidade e clareza a articulação das cenas dispostas em espaços simultâneos e situadas em tempos diferentes. Mesmo fora de cena, os intérpretes continuam visíveis e esse recurso do teatro narrativo é, neste caso, um modo agradável de eliminar as falsas saídas em uma comédia que não tem a intenção de ser realista.
Exuberância. As personagens igualmente simples nas motivações e na expressão dialógica também não são um grande desafio para os intérpretes e o bom elenco reunido para o espetáculo toma um certo cuidado para não ultrapassar a modesta estatura das personagens e situações. Apenas a primeira cena tem um volume maior do que o necessário para indicar a exuberância dos recursos vocais dos italianos, imitando talvez a intensidade das aberturas operísticas. Logo em seguida, o espetáculo abaixa o tom e segue a trilhazinha segura desse tipo de teatro cujo objetivo, parece, não é apenas divertir, mas reafirmar com certo otimismo a solidez de uma nova moral sexual.
Ariano Suassuna tem o hábito de protestar publicamente e de modo quase furioso contra a emulação fantasiosa ou incompetente do sotaque nordestino. Não só isso. Como nativo da Paraíba e morador de Recife, revolta-se contra as deturpações da sonoridade, da sintaxe e do vocabulário do "dialeto" nordestino. Pois nós, paulistanos, versados no cantarolar que se espraia da zona leste da cidade, deveríamos reivindicar esse patrimônio imaterial e denunciar a ilegitimidade das contrafações inspiradas, ao que parece, no modo como os atores do cinema norte-americano representam mafiosos.

Fonte:estadao