domingo, 16 de fevereiro de 2014

Dividir para reinar

Ao separar a Gafisa da Tenda, grupo traça o caminho para que as empresas, no mínimo, dobrem de tamanho em três ou quatro anos

Por Márcio JULIBONI

Do general chinês Sun Tzu (séc. V a.C.) ao pensador florentino Nicolau Maquiavel (1469-1527), a ideia de dividir para reinar sempre foi associada à estratégia de separar as forças inimigas para enfraquecê-las e, assim, vencer a batalha. Dividir as próprias tropas, porém, não é uma prática comum, mas é a base do plano que a incorporadora Gafisa anunciou, na segunda semana de fevereiro, para dar um salto nos próximos anos. O objetivo é transformar suas marcas Gafisa e Tenda em empresas independentes. Se tudo der certo, o grupo espera, no mínimo, dobrar de tamanho no médio prazo com o desmembramento. “A soma das partes valerá mais que o todo atualmente”, afirma o presidente da Gafisa, Alceu Duilio Calciolari.
 
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Por conta própria: Sandro Gamba (à esq.) e Rodrigo Osmo assumirão
o comando da Gafisa e da Tenda, respectivamente, e as empresas
tomarão rumos cada vez mais distintos
 
Um exemplo do que se espera com a mudança é a evolução dos lançamentos. No ano passado, os imóveis com a marca Gafisa somaram R$ 1,085 bilhão. Já a Tenda, focada em habitação popular e que passou dois anos sem colocar nada no mercado, enquanto era reestruturada para sair de uma grave crise, lançou R$ 338 milhões. Assim, as duas somaram R$ 1,4 bilhão. Segundo Calciolari, em três ou quatro anos, a Gafisa tem condições de alcançar um patamar de R$ 2 bilhões a R$ 2,5 bilhões de valor geral de venda por ano. Qual é o segredo? Liberar recursos e energia das empresas. “Agora poderemos focar a companhia na sua própria operação, e há um mercado espetacular para as duas”, diz Calciolari. 
 
Para a Tenda, a cifra deve girar entre R$ 1 bilhão e R$ 1,5 bilhão. Isso significa que as empresas podem dobrar de tamanho nesse período. Esses números também circulam pelo conselho de administração da incorporadora. “Há muito valor a ser gerado”, afirma um conselheiro, que pediu para não ser identificado. Embora a ideia de desmembrar as duas construtoras tenha começado a ser discutida mais seriamente em meados do ano passado, há pelo menos dois anos o comando da Gafisa tinha consciência de que a marca focada no médio e alto padrão e a Tenda não ganhavam nada juntas, com caixa e direção em comum. “As sinergias são tão pequenas quanto as de uma fusão entre uma companhia aérea e uma confecção”, afirma o conselheiro. 
 
Na prática, apenas a centralização das tarefas administrativas trazia alguma economia. O compartilhamento de materiais e técnicas de construção não trouxe os resultados esperados, simplesmente porque as marcas atuam em mercados distintos, utilizando produtos diferentes. “Um projeto da Gafisa requer mais artesanato, e a Tenda é praticamente uma indústria”, compara Calciolari.Mas a incompatibilidade operacional não é tudo. A separação das empresas representa também uma correção de rota. “A compra da Tenda foi uma grande besteira”, diz, sem meias palavras, o conselheiro da empresa. “O problema foi fazer tudo correndo, sem uma auditoria detalhada.” 
 
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Fim de um ciclo: Calciolari deixará a presidência da Gafisa em 90 dias, após a transição -
"A soma das partes (Gafisa e Tenda) valerá mais que o todo atualmente"
 
A companhia mineira, adquirida em 2008, revelou-se uma fonte de preocupações. Em 2011, quando o atual conselho de administração assumiu e Calciolari foi nomeado presidente, o comando da Gafisa decidiu incorporar a Tenda para lhe aplicar um “choque de gestão”. Ao separar novamente as marcas, a direção do grupo indica que a reestruturação da Tenda foi concluída. “Se tivéssemos separado as operações há dois anos, seria um desastre”, diz o conselheiro. Em 90 dias, o executivo Rodrigo Osmo, atual superintendente, assumirá a presidência da Tenda, que passará a ser uma companhia autônoma. 
 
O executivo, que até agora se reportava a Calciolari, responderá apenas ao conselho de administração do grupo. Sem ter de se preocupar com a Tenda, a Gafisa voltará às suas origens: a construção e venda de imóveis de médio e alto padrão nas regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro. “Temos as condições para continuar atuando no segmento em que somos referência”, diz Calciolari. O executivo afirma que a Gafisa pode deter de 4% a 6% de participação de mercado na capital paulista, que recebeu lançamentos de R$ 20 bilhões no ano passado. A tarefa de consolidar a empresa caberá a Sandro Gamba, que assumirá a presidência após o período de transição comandado por Calciolari, que deverá deixar as funções executivas na Gafisa.
 
É claro que entre as intenções e os resultados, uma série de percalços pode ocorrer. Para os investidores, por exemplo, ainda há dúvidas sobre se a Tenda conseguirá mesmo caminhar com as próprias pernas. “Seria ruim ver a Gafisa ainda bancar alguns custos da Tenda”, afirma o analista de mercado Lenon Borges, da corretora Ativa. Outra dúvida é se o cenário continuará favorável, a ponto de sustentar o crescimento das duas companhias no ritmo desejado. Mas, pelo menos até agora, os especialistas em mercado imobiliário não enxergam sinais de perigo. 
 
Segundo Claudio Bernardes, presidente do Secovi-SP, entidade que representa as incorporadoras paulistas,o mercado de médio e alto padrão continuará com boa demanda nos próximos anos, devido ao bônus demográfico – o crescimento da população e as novas famílias, que vão precisar de um imóvel. Já o Minha Casa Minha Vida deve continuar, mesmo no caso de uma eventual troca de governo. “É um programa politicamente interessante para todos”, diz Bernardes, do Secovi-SP. Basta lembrar que o déficit habitacional em 2011 (último dado disponível) era de 3,352 milhões de moradias. Agora, com os negócios em ordem, autonomia e um mercado favorável, Gafisa e Tenda estão em melhor condição do que nunca para construir seus próprios reinos e povoá-los com os clientes que lhes faltaram até o passado recente.
 
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segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Brasil, paraíso das autoridades que mentem e não aceitam críticas

O italiano Nicolau Maquiavel, em O príncipe, uma de suas mais conhecidas obras, basicamente um manual de como um chefe público deve se portar, disse que para permanecer no poder, o líder deve estar disposto a desrespeitar qualquer consideração moral, recorrer inteiramente à força, ao poder, manipular e até mentir. Foi mais longe, afirmou que é mais fácil fazer as pessoas acreditarem numa grande mentira dita muitas vezes, do que numa pequena verdade poucas vezes ditas. 
No Brasil, muitas autoridades públicas parecem seguir à risca as receitas do autor do manual, ao ponto de não burlar uma vírgula, a não ser que seja para seu próprio favorecimento. 
Neste paraíso das autoridades que mentem e não aceitam críticas, responder à interrogação de um agente policial, durante uma abordagem de rotina, parece ser mais desrespeitoso que não ficar quieto (sob uma chuva de chutes nas canelas, tapas na cara e pauladas de cassetetes nas costas), é considerado um verdadeiro desacato à autoridade, como se todas elas, as autoridades, fossem honestíssimas, ao ponto de não se corromperem por nada. Discordar da ideia de um funcionário público em seu pleno exercício da função, então, poderá levar o cidadão à prisão, mas o atendimento malfeito por muitos servidores públicos chega a ser uma verdadeira falta de consideração para com o cidadão que, obrigatoriamente, procura o serviço e pagam os salários dos agentes do Estado.
No Brasil, onde é proibido proibir, discordar de uma autoridade, ainda que ela esteja equivocada, é permanentemente proibido e aqueles que se atreverem a criticar um ato, mesmo que errado e irresponsavelmente cometido por um indivíduo que praticou alguma ilegalidade poderão ser taxados de ilegais.
Ora, ainda não faz muitos dias que a opinião sobre a queda de uma passarela causada por um caminhão-caçamba que deixou cinco mortos na Linha Amarela, na altura de Pilares, no Rio de Janeiro, de Rachel Sheherazade, jornalista que vem ganhando destaque e respeito, repercute Brasil adentro. 
A opinião da âncora do “SBT Brasil” foi recebida positivamente pelos milhares de brasileiros comuns que ainda acreditam no poder da mudança, gerando comentários nas ruas, nas aglomerações, nas redes sociais e em muitos veículos de comunicação, mas quem não gostou do comentário mesmo foram muitas autoridades públicas, ou privadas atreladas às tretas públicas, incluindo as três esferas do poder. É, parece que aqui no país do carnaval é preciso policiar a generalização e ninguém pode dizer que no Brasil “Está tudo errado!", como disse a jornalista Rachel Sheherazade. 
Vamos corrigir isso, então? Nada está errado? Estão corretas todas as autoridades deste país, mesmo quando muitas buscam se esquivar de suas próprias culpas? Aliás, neste país dos contrastes, nesta terra das desigualdades sociais, no país da mentira e da malandragem errado está a jornalista por falar a verdade? Errado está este colunista ao pensar que Nicolau Maquiavel é italiano quando é brasileiro? Errado está o pobre, por ter nascido pobre? Errado, enfim, estão todos aqueles que buscam trilhar seus caminhos galgados na verdade?
Nada disso, apague todo o parágrafo acima porque a verdade pode até tardar, mas ela não falha. Quando a verdade chega a mentira some e a verdade cabe em todos os lugares e é para ser exercida, custe o que custar e doa a quem doer. 
A verdade é que nesta Nação onde as autoridades, muitas vezes, negligenciam resultados com intuito de favorecer aquele que possuir maior poder aquisitivo, muita coisa precisa ser mudada.
(Gilson Vasco, escritor)

Fonte:DM.Com