segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Façanhas dignas de Maquiavel

"As leis são como as salsichas. É melhor não ver como elas são feitas". Em minha juventude, muito antes de conhecer essa opinião de Bismarck, visitei uma fábrica de salsichas. Nunca mais fui capaz de comê-las sem lembrar a sujeira daquelas fábricas. Bismarck estava certo não apenas quanto às salsichas mas, muito mais ainda, quanto às leis.

Apoiado na história política brasileira dos últimos 50 anos, proponho, no entanto, estender a comparação aos acordos e alianças parlamentares das bases de sustentação política dos presidentes da República.

Querem ver? Imaginem um palanque hoje, com Lula e Dilma, ao lado de figuras tão desgastadas do PMDB e de outros partidos, como Sarney, Renan Calheiros, Jader Barbalho, Collor et caterva, triunfantes e sorridentes (rindo de nós). Na campanha de Serra, vejo outra figura polêmica do mesmo partido: Orestes Quércia.

Desculpem-me, mas não consigo engolir.

A charcutaria. Ao longo dos últimos 7 anos e meio, a salsicharia de Lula & Cia. transformou o setor público das Comunicações em terra arrasada, como Roma invadida pelos bárbaros.

A pretexto de assegurar a governabilidade, como fazem todos os presidentes da República, Lula também divide o bolo do poder entre os partidos da base governista, nomeando muitas vezes pessoas sem a devida qualificação profissional e moral para ministérios, agências reguladoras ou empresas estatais. Nesse aspecto, exagera na dose.

Sempre me pergunto: que interesse teria o PT, o PMDB ou qualquer outro partido em emplacar seus representantes nos ministérios e na direção de estatais, se eles não forem, comprovadamente, competentes e honestos? Por que nomear Carlos Henrique Cardoso para os Correios, peemedebista e amigo de Hélio Costa e, dessa forma, degradar a ECT, uma estatal que já foi um padrão de eficiência?

O Ministério das Comunicações (Minicom) foi entregue ao PMDB em 2004, com a posse de Eunício de Oliveira (PMDB-CE). Seu sucessor, também do PMDB, foi o senador Hélio Costa, jornalista e radiodifusor.

Cerco ao Minicom. Faltou a Hélio Costa uma condição básica para fazer uma boa gestão: um projeto sério para o setor. Além disso, não contou com a plena confiança de Lula nem com o apoio da ex-ministra-chefe da Casa Civil. Suas relações com Dilma só se deterioram ao longo de 5 anos.
Pior do que tudo foi a guerra palaciana que lhe moveu um grupo de assessores liderados por Cezar Alvarez, assessor especial de Lula, e por Rogerio Santanna, ex-secretário de Logística do Ministério do Planejamento e atual presidente da Telebrás.

Nasceu, assim, uma nova fábrica de salsichas no Planalto. Com apoio político da cúpula do governo, a dupla de assessores conseguiu duas façanhas dignas de Maquiavel: excluir o Ministério das Comunicações tanto da elaboração do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) quanto da decisão de reativar a Telebrás, empresa estatal que sempre esteve subordinada àquela pasta. Hoje, totalmente desautorizado em sua própria esfera legal de atuação, o Minicom não passa de uma ficção.

No final da história, os enfants gatés de Lula e Dilma não apenas implodiram o ex-ministro, mas também esvaziaram o Minicom. Restou a Hélio Costa a consolação de fazer seu sucessor. Na cota de salsichas do PMDB, Lula nomeou o novo ministro das Comunicações, José Artur Filardi Leite, ex-chefe de gabinete de Hélio Costa desde 2005, seu conterrâneo de Barbacena e seu ex-sócio na Rádio Sucesso, da mesma cidade.

Poder da dupla. Essa degringolada do Ministério das Comunicações não resultou apenas do fraco desempenho de Hélio Costa, como ministro, mas de sua derrota política e ideológica perante a cúpula do governo Lula e da conspiração palaciana liderada por Alvarez e Santanna. É claro que esses assessores vão, agora, dividir o espólio do setor público das Comunicações. Aos vencedores, as batatas.

Hélio Costa perdeu a guerra principalmente por ter mandado elaborar e divulgar, sem o aval da dupla petista, um estudo sobre o PNBL - que não apoiava a recriação da Telebrás.

A reação foi implacável: com o apoio tácito de Dilma, o segundo escalão tomou as rédeas do PNBL e, sem ouvir o Minicom, decidiu reativar a Telebrás.

Não me comove em nada a implosão do ex-ministro, mas me preocupa, e muito, como brasileiro, a degradação política das Comunicações, a perda de horizontes e o esvaziamento da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

Trapalhadas. Vejamos, por fim, um exemplo da performance medíocre do governo Lula na área de inclusão digital, a começar do Programa Gesac (Governo Eletrônico e Serviços ao Cidadão), a cargo do Ministério das Comunicações.

Esse projeto previa levar a banda larga, em duas fases, a um total de 107 mil escolas de primeiro e segundo graus, numa parceria com as maiores concessionárias de telefonia, em que caberia a essas empresas conectar as escolas, e, ao governo, treinar 80 mil professores, produzir conteúdos, adquirir, instalar os computadores e manter os equipamentos.

O programa previa a entrega de 55 mil escolas conectadas no fim de 2010 e contratar sua ampliação para 107 mil escolas. Mas nada acontecerá, porque, embora as concessionárias tenham feito sua parte, ligando as escolas, o governo não cumpriu suas obrigações.

Fonte:Oestadao

sábado, 21 de agosto de 2010

Trânsito russo

Na segunda-feira última, às 18 horas em ponto, saí de carro e com motorista da Edífico da Editora Abril, na Marginal do Pinheiros, onde, durante os dias, trabalho. Nosso destino era o bairro Itaim-Bibi, ali do lado. Meu objetivo era assistir à palestra do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, sobre o pensador Nicolau Maquiavel, autor do clássico dos clássicos da ciência política, O Príncipe.
Partimos, de início, em direção ao Norte. Sei disso porque ando sempre com bússola em São Paulo. A ideia era atravessar a ponte da Cidade Universitária e voltar, ao Sul, pelo outro lado da Marginal. Mas depois de avaliar as condições de trânsito do lado de lá, chegamos, o motorista e eu, à mesma conclusão: nem pensar. Iríamos pela Faria Lima mesmo.
Pegamos a Pedroso de Moraes, passamos em frente do Habib"s e do Pirajá, chegamos ao Largo da Batata (Potato Square, diz o meu filho, Lucas) e à maravilhosa estação de metrô nova e paramos. E dali não saímos. Passaram-se 15 minutos. O sinaleiro, lá na frente, abria e fechava, abria e fechava, abria e fechava - e nada. Avançamos dois metros, se tanto. Deu meia hora. De vez em quando algum motorista buzinava com agressão, como se fosse um grito de angústia. Outros seguiam o exemplo com um pequeno retardo. Parecíamos gado ao perceber que estávamos todos encurralados, aos berros. E, claro, a barulheira infernal em nada melhorava nossa situação. O tempo passava e nós permanecíamos no mesmo lugar.


Por sorte, eu estava equipado com meu novo telefone inteligente. Descrevi na internet minha situação, via Facebook. De Londres, recebi uma mensagem: "Matheus, só a bicicleta nos salva." Talvez em Londres, pensei. Em São Paulo, acho mais prudente andar a pé. Outro amigo, este de São Paulo, lembrou o conto de Cortázar, A Autoestrada do Sul. Era fascinante isso. Discutir Cortázar e bicicletas com amigos ao redor do mundo era possível; chegar ao bairro do lado, não. Pelo menos de carro.

Quando deu 19 e pouco, desisti da palestra, um pouco envergonhado, confesso. Mas as notícias, que chegavam através do rádio, eram tenebrosas. Rebouças parada. Marginal parada. Faria Lima, Bandeirantes e não sei onde mais. Teria assistido à palestra, que em tese começava às 19 horas, se tivesse ido a pé. Tranquilo.

Pedi ao motorista para dar um jeito, fugir daquela muvuca na primeira oportunidade. Com muito esforço, ele conseguiu sair à direita, deu uma volta grande pela praça do Pôr-do Sol e, em dez minutos estava em casa, ali, próximo da Vila Madalena. O relógio marcava 19h46. Ficara no automóvel, sem sair do bairro de Pinheiros por quase duas horas.

Para minha felicidade, trazia na mochila a última edição da revista New Yorker, que a garota da banca guardara para mim. Há poucos prazeres maiores do que deitar no sofá e abri-la depois de um longo dia de trabalho (a National Geographic, talvez...)

Você não vai acreditar, mas a revista do dia 2 de agosto traz uma reportagem sobre o trânsito de Moscou, assinada por Keith Gessen. Confirma a tese do meu saudoso guru, o historiador Richard M. Morse, que alertava os jovens alunos dos anos 80 para as semelhanças entre as culturas brasileira e russa, perceptíveis, segundo ele, nos romances dos dois países.

Não conheço Moscou. Mas segundo a New Yorker, lá existe uma espécie de marginal e também um rodoanel e ainda outro "anel", que faz um terceiro círculo em torno da cidade e já se transformou na rodovia mais congestionada da região, quiçá do mundo. O prefeito de Moscou, Yuri Luzhkov, dedica-se a resolver o problema há muitos anos, conforme explica o autor da reportagem. É tarado por trânsito. Volta sempre do exterior com uma nova solução. Despreza o transporte público. Para o prefeito, "transporte público é para fracassados (losers)", isso nas palavras do Gessen. Não é para menos. "Proprietários de constituem o único grupo social inventado na Rússia nos últimos 20 anos." No momento, o prefeito se dedica à construção do quarto anel rodoviário! Cada um, diga-se, tem 8, 10, às vezes 12 pistas.

Enquanto lia a descrição do trânsito de Moscou, fui me acalmando. Nossa situação podia ser pior. Lá existem até ativistas do tráfico rodoviário, sabia? Há músicas de rap dedicadas ao assunto, como Mercedes S-666: "Saia da frente camponês/ que o patrão está na rua." E protestos que vão além das nossas buzinas. Num deles, os motoristas amarraram baldes plásticos, azuis e vermelhos, em cima de seus automóveis como protesto contra os carros "oficiais" que utilizam sirenes e luzes (vermelhas e azuis) para avançar o sinal. Ao imaginar essa cena, tive que dar risada. Nem os surrealistas inventaram nada tão ousado em termos estéticos: uma imensa instalação ou intervenção artística. E existe ainda um dissidente, chamado pelo autor da reportagem de "o Sakharov do trânsito".
Moral da história: "Nenhuma cidade jamais conseguiu sair dos congestionamentos com a construção de rodovias." As palavras são do especialista em trânsito Vukan Vuchic, da Universidade da Pensilvânia. Ou seja: não adianta buzinar.N

Fonte:estadao

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Nicolau Maquiavel

Maquiavel escreveu O príncipe em 1513, em sua propriedade nos arredores de Florença, na região italiana da Toscana. Naquele ano, depois da dissolução do governo da cidade e do retorno da família Médici ao poder, Maquiavel foi preso, acusado de conspiração. Perdoado pelo papa Leão X, ele se retirou da vida pública e passou a escrever suas grandes obras. O príncipe foi publicado postumamente, em 1532.
O contexto histórico em que Maquiavel escrevia era de grande instabilidade política. O exercício do poder e sua manutenção já não dependiam apenas da hereditariedade e dos laços de sangue. Por isso, o autor escreve um tratado sobre a conduta do príncipe, sobre as melhores formas de o soberano tomar o poder e conservá-lo.
O autor vai colher na História variados exemplos para comprovar seus pontos de vista, a começar pela conduta de alguns de seus contemporâneos, como César Borgia, Francesco Sforza e o papa Júlio II. Mas Maquiavel recorre também ao conhecimento de outras épocas, como a Antiguidade e a Idade Média, e à sua vastíssima erudição sobre os romanos, os gregos e outros povos, de diversas regiões.
Em estilo direto, límpido e por vezes levemente irônico, Maquiavel recomenda ao soberano cultivar certas qualidades - ou, se não for possível, que pelo menos aparente ter virtudes, pois ostentá-las é útil para manter o poder. As cinco principais qualidades de caráter aconselhadas ao soberano dizem respeito ao seu espírito: ser piedoso, fiel, humano, íntegro e religioso. Ainda assim, reconhece o autor, para preservar o Estado muitas vezes é necessário operar contra a fé, contra a caridade, contra a humanidade, contra a religião.
Algumas concepções de Maquiavel parecem paradoxais. É o caso também das ideias sobre a conduta do príncipe em relação a seus súditos e ao povo. O autor chama a atenção para a necessidade de oprimir os primeiros, mas também reafirma a necessidade de ser querido pelo povo e protegê-lo. Apesar de contraditórias, suas ideias se harmonizam quando se tem em vista que os dois conceitos mais importantes do livro são "fortuna" e "virtude".
Segundo o autor, um bom príncipe é aquele que sabe aproveitar os momentos de fortuna, isto é, a sorte e os momentos propícios à ação. Não se trata, porém, unicamente de acaso ou de oportunidade. É necessário também virtude, ou seja, caráter e habilidade. Como diz o próprio Maquiavel, ao Príncipe é necessário "que ele tenha um espírito disposto a voltar-se para onde os ventos da fortuna e a variação das coisas lhe ordenarem; e [...] não se afastar do bem, se possível, mas saber entrar no mal, se necessário".

1. Qual é a principal distinção que Maquiavel faz sobre o caráter dos principados? No que consiste a fortuna e a virtude, características que determinam o sucesso de um príncipe na tomada e manutenção do poder?
Maquiavel distingue os principados em hereditários, nos quais a linhagem familiar e de sangue determina a sucessão do poder, e em principados novos, isto é, conquistados por armas próprias ou alheias. Na prática da guerra e no exercício do poder, os príncipes são guiados pela fortuna, ou seja, pela sorte e pelas circunstâncias, ou por virtude, isto é, por seus méritos, valores e qualidades. (capítulo I)


2. Por que, segundo Maquiavel, é mais fácil manter o poder nos Estados herdados e sujeitos ao sangue de seus príncipes do que nos Estados novos? Por que nestes é inevitável ao príncipe oprimir seus súditos?
Porque nos principados em que a sucessão do poder é hereditária basta não infringir a ordem sucessória da estirpe e saber lidar com os imprevistos. O soberano natural, segundo Maquiavel, é aceito por seus súditos mais facilmente. Uma vez guindado ao poder, o príncipe que assumiu graças aos seus laços de sangue se manterá soberano com mais tranquilidade, a menos que uma força maior o destitua. A continuidade do poder também tende a apagar as demandas por inovações e mudanças, as quais geram intranquilidade. Já os principados novos são mais instáveis, pois o príncipe que tomou o poder será imediatamente avaliado pelos novos súditos, que acreditam poder melhorar de condição se pegarem novamente em armas contra o soberano. O príncipe, assim, precisará submeter os novos seguidores. Ao mesmo tempo, o príncipe não pode apenas oprimi-los, pois é preciso agradá-los e honrar a dívida para com os provincianos que dominou. (capítulos II e III)


3. Quais as principais dificuldades de um soberano que conquista ou anexa outro Estado? Quais são as condições que determinam o sucesso de um governante de um principado misto?
As principais dificuldades são os contrastes entre as línguas, os costumes e as leis entre o principado original e o novo. Por isso, é preciso grande habilidade para manter um principado misto. Um dos meios mais eficazes para conservar o poder sobre o novo principado é que o conquistador vá habitar as terras anexadas, tornando mais seguro e mais durável seu domínio. A presença do soberano evita que seus prepostos ou representantes espoliem a província e permite que os súditos recorram diretamente ao governante. Para o autor, é preciso extinguir a linhagem de sangue do príncipe anterior e não alterar as leis vigentes nem o regime de impostos. Assim, em pouco tempo, o principado novo será totalmente incorporado ao antigo. (capítulo III)


4. Apesar de ter se pautado pela ponderação e pelo diálogo em sua trajetória intelectual e política, Maquiavel tem uma visão contundente a respeito da guerra. Segundo ele, por que não é possível evitar a guerra?
Maquiavel diz que o desejo de conquista é algo natural e que a guerra não se evita, apenas se adia em favor de outrem. Portanto, já que ela é inevitável, e postergá-la só traz vantagens ao adversário, ele recomenda que, a fim de evitar um conflito prejudicial, jamais se deve deixar que um distúrbio se alastre. É um erro empreender uma guerra quando ainda não se tem força para tanto. (capítulo III)
Mas o príncipe não deve ter outro objetivo nem outro pensamento que não a guerra, pois ela é a arte de quem comanda, uma atitude esperada e inerente ao exercício do poder. É por ela que se mantêm os que já nasceram príncipes, mas também chegam ao poder os homens de fortuna pessoal. (capítulo XV)
O autor recomenda ainda que o príncipe cultive a fama de cruel, pois isso ajuda a manter o exército unido e disposto ao combate. (capítulo XVII)
A guerra, além disso, traz prestígio e não há nada que faça um príncipe mais estimado que empreender grandes campanhas militares para legar memoráveis exemplos de si mesmo. (capítulo XXI)


5. Maquiavel expõe dois modos de passar de homem privado a príncipe, sem que se deva atribuir tudo à fortuna ou à virtude. Quais são eles? Explique.
Há casos em que se ascende ao principado por meios "nefandos e celerados" e casos em que um homem comum se torna príncipe de sua pátria "graças ao favor de outros concidadãos". No primeiro caso, incluem-se os soberanos que tomaram o poder por atitudes criminosas, como massacres, assassinatos, traições, crueldades e atrocidades. No segundo caso, por favor de seus concidadãos, o soberano constitui um "principado civil". Para chegar a ele, não é preciso virtude nem fortuna, mas astúcia e apoio popular ou dos poderosos. Segundo Maquiavel, esta é uma característica de todas as cidades assistir a tendências opostas: de um lado, o povo, que não quer ser comandado nem oprimido pelos poderosos; de outro os poderosos, que querem comandar e oprimir o povo. Segundo o autor, esses dois desejos antagônicos trazem uma das seguintes consequências: principado, liberdade ou desordem. (capítulos VIII e IX).


6. Apesar de não se mostrar favorável ao modo de obter o poder por meios criminosos, o autor tece considerações sobre os procedimentos para manter-se no poder, mesmo nesses casos. O que ele recomenda a um príncipe usurpador?
Ao tomar um Estado, o príncipe usurpador deve praticar a violência de um só golpe, para não ter de renovar as atitudes de opressão. Com isso, tranquiliza os súditos e os seduz com benefícios. Para o autor, as injúrias devem ser executadas todas de uma só vez, com brevidade, para que "ofendam menos ao paladar". Já os benefícios devem ser feitos aos poucos, "para que sejam mais bem saboreados". (capítulo VIII)


7. Por que o autor evita debruçar-se sobre os chamados principados eclesiásticos?
Porque, segundo ele, esses principados são sustentados por leis antigas, radicadas na religião. São tão poderosos que conseguem conservar seus príncipes no poder não importa como estes se comportem ou vivam. São também governados por razões superiores, "que a mente humana não alcança". Uma vez que são louvados e mantidos por Deus, para Maquiavel discorrer sobre eles seria "presunçoso" e "temerário". (capítulo XI)


8. Nos capítulos XII, XIII e XIV, o autor chama a atenção mais uma vez para a importância da guerra e descreve os principais tipos de tropa de que se pode dispor. Quais são elas? Segundo o autor, é preferível dispor de armas próprias ou mercenárias?
As armas com as quais um príncipe defende seu Estado ou são próprias, ou são mercenárias e auxiliares, ou uma mistura de ambas. As mercenárias e auxiliares são aquelas que combatem não por lealdade, mas por interesse ou pelo soldo, isto é, pelo pagamento. As armas auxiliares - igualmente ruins e até mais perigosas, segundo o autor - são aquelas solicitadas a outro poderoso para que o defendam. As armas próprias são aquelas compostas de súditos, de cidadãos ou de vassalos. Para o autor, as tropas mercenárias são inúteis e perigosas, pois desunidas, ambiciosas, indisciplinadas e infiéis. Não trazem segurança nem estabilidade. Com essas armas, "quanto mais se adia o combate, mais se adia a derrota". Por isso, o autor diz que é preferível dispor de armas próprias, pois sem elas nenhum principado estará seguro; ao contrário, fica inteiramente à mercê da fortuna.


9. O que o autor sugere ao príncipe nos tempos de paz?
Recomenda nunca se manter ocioso. Sugere conhecer bem o próprio território, o que permite aprender a localizar o inimigo, montar acampamentos, conduzir os exércitos, organizar as expedições e, em situação vantajosa, assediar outras cidades. Aproveitando esse período com engenho, ele irá agir melhor na adversidade e, quando a fortuna mudar, estará preparado para resistir. Recomenda, ainda, a prática da caça e o exercício da mente: ler obras de história e nelas examinar as ações dos homens ilustres, ver como eles conduziram as guerras e analisar as causas de suas vitórias e derrotas. (capítulo XIV)


10. Como a condição humana não permite, muitas vezes, que o príncipe tenha todas as qualidades necessárias ao exercício da função, o autor recomenda evitar certos vícios que coloquem em risco o governo. Quais são esses vícios?
Alguns dos principais vícios ou defeitos que ameaçam o príncipe são: ser miseráveis ou avaros, rapaces, cruéis, desleais, efeminados e pusilânimes, soberbos, lascivos, inflexíveis e incrédulos. (capítulo XV)


11. O que recomenda o autor a respeito da cobrança de impostos e da condição de liberal?
Maquiavel considera vantajoso ao príncipe ser liberal. Mas diz que, se essa prática tiver objetivo apenas de alcançar reputação, pode causar transtornos, pois a liberalidade excessiva faz o príncipe ser desprezado ou odiado, algo que ele deve evitar acima de tudo. Segundo o autor, para manter a fama de liberal é preciso lançar mão de todo "fausto" (luxo) possível. Isso obriga ao príncipe consumir muitos recursos, sobrecarregando a população de tributos e arrecadações. Assim, a liberalidade em excesso irá deixar os súditos cada vez mais pobres. Por isso, se for prudente, ele não deverá se importar com a fama de avarento, em benefício dos cidadãos. (capítulo XVI)


12. Para Maquiavel, é preferível ao príncipe ser amado ou ser temido?
Segundo o autor, todos os soberanos gostariam de ser amados e temidos. Porém, é difícil conciliar as duas coisas. Assim, é mais seguro ser temido que amado, pois o vínculo de amor entre os homens é frágil, já que mantido por reconhecimento e passível de ser rompido pelo egoísmo. Nos momentos favoráveis, o príncipe age com benevolência e os súditos tendem a amá-lo. Nos momentos de dificuldade, porém, é comum aos súditos passar à revolta. O temor, assim, é mantido com mais segurança, por conta do medo que os homens têm da punição. É preciso, porém, inspirar temor sem suscitar o ódio. (capítulo XVII)


13. O que o autor recomenda para que o príncipe não desperte o ódio dos cidadãos?
O autor recomenda não cobiçar as mulheres nem os bens de seus concidadãos. Especialmente evitar a cobiça dos bens, pois os homens "se esquecem com maior rapidez da morte de um pai que da perda do patrimônio". (capítulo XVII)


14. Segundo Maquiavel, os homens são essencialmente bons ou maus?
Para o autor, os homens são essencialmente maus. Em geral, são ingratos, volúveis, fingidos, dissimulados, avessos ao perigo e gananciosos. (capítulo XVII)


15. Por que o príncipe precisa se valer do animal e do homem que há dentro dele? A quais animais o autor se refere metaforicamente para exprimir as atitudes de astúcia e força?
Segundo Maquiavel, existem duas "matrizes de combate": o combate por meio das leis, próprias dos homens; e o combate pelo uso da força, própria dos animais. Como nem sempre a primeira matriz basta, é preciso recorrer à segunda. O autor associa a astúcia à raposa e a força ao leão. (capítulo XVIII)

16. No capítulo XXI, Maquiavel recomenda algumas atitudes do príncipe para com o cotidiano da cidade e a vida civil e econômica. O que o soberano deve encorajar na vida de seus súditos?
O príncipe deve oferecer hospitalidade aos homens virtuosos e aos artistas. Deve encorajar os cidadãos a exercer seus ofícios no comércio, na agricultura e em outras atividades, assegurando o direito à propriedade e incentivando a abertura de novos negócios, sem que os impostos sejam um empecilho à atividade comercial. Deve promover festas e espetáculos populares e periodicamente se reunir com a comunidade, conhecendo as corporações e os bairros, dando exemplo de humanidade e munificência (generosidade), mantendo, porém, a majestade de seu posto.

17. No Capítulo XXV, Maquiavel discorre sobre a relação entre a fortuna e o livre-arbítrio, ou seja, a capacidade humana de reger o próprio destino. A que o autor compara a fortuna?
O autor diz que muitos têm a convicção de que o mundo é governado apenas pela fortuna e por Deus, sem que os homens possam mudá-lo. Por isso, as pessoas acham que não vale a pena lutar contra o curso das coisas, deixando-se conduzir pela sorte e pelo destino. Entretanto, diz Maquiavel que a fortuna determina apenas parte das ações humanas e que outra parte é governada pelo livre-arbítrio. O autor compara a fortuna a um rio caudaloso e devastador, que com suas águas enfurecidas alaga planícies, derruba árvores e faz ruir construções. Com isso, diz que a fortuna demonstra toda sua potência, se a virtude não lhe colocar freios. Portanto, o príncipe não pode se apoiar inteiro na fortuna, pois ele se arruinará tão logo as circunstâncias mudem. Compara, ainda, a fortuna à mulher. Na condição de mulher, segundo Maquiavel, a fortuna é favorável aos jovens, que por serem menos respeitosos, mais ferozes e mais audaciosos a comandam mais facilmente. Para dominar a fortuna, portanto, é melhor ser impetuoso que prudente.


Leituras recomendadas

Biografia de Nicolau Maquiavel. Roberto Ridolfi. Musa Editora, 2008.
Maquiavel passo a passo. Newton Bignotto. Jorge Zahar Editora, 2003.
Maquiavel. Coleção Os Pensadores. Trad. de Lívio Xavier. Editora Nova Cultural, 2003.
Maquiavel no Inferno. Sebastian de Grazia. Companhia das Letras, 1993.


Fonte:Companhiadasletras

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

FHC ensina Maquiavel: "Às vezes, o presidente deve mentir"

Cercado de intelectuais no Cultura Artística Itaim, em São Paulo, na noite desta segunda-feira, 9 de agosto, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso recolhe elogio temporão pela conferência de abertura da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), na homenagem ao sociólogo pernambucano Gilberto Freyre. "Só se fala no senhor. Todos gostaram!", afaga um conviva, durante o coquetel de lançamento da parceria Penguin-Companhia das Letras.

Com a presença de Lygia Fagundes Telles, João Moreira Salles, Lilia Moritz Schwarcz, Eduardo Gianetti da Fonseca e Matinas Suzuki Jr., as editoras lançaram "O príncipe", de Maquiavel, "Pelos olhos de Maisie", de Henry James, "Essencial Joaquim Nabuco" e "O Brasil Holandês" (organizado por Evaldo Cabral de Mello).

Autor do prefácio de Il principe, o "príncipe dos sociólogos" lustra a modéstia, segurando uma taça, perto de entrar no auditório para uma conferência sobre Nicolau Maquiavel (1469-1527): "Não sei o que vou falar. Já está tudo aqui". Rosto lavado, aprumado num terno cinza, FHC ouve o editor Luiz Schwarcz chamá-lo de "um clássico":

- ...O presidente que, em si, já é um clássico da sociologia brasileira...

Na hora do solilóquio, o líder do PSDB sobe as escadinhas do palco e comprime o ego:

- Não sou clássico coisa nenhuma!

Depois de Casa Grande & Senzala, ele marcha no agosto literário com a República de Florença & Machiavelli. Dispõe-se a não chatear a plateia.

- Outro dia, Gilberto Freyre deu mais trabalho que Maquiavel.

No início da aula sobre o clássico decifrador dos ardis da política, FHC se refugia na cautela dos sociólogos, mas faz sobrevoos sobre o Brasil num tom provocante, mesmo quando não deseja metaforizar uma república sul-americana bem distante - tempo e espaço - das tramas violentas de César Bórgia.

- É difícil dizer uma coisa que ninguém tenha dito sobre Maquiavel. Aliás, uma das características das obras clássicas é que todo mundo fala sobre elas, o que gera muito desacordo... Não é só com Maquiavel que acontece isso. Leio toda hora coisas a meu respeito que eu nunca pensei.

A princípio, recupera a história italiana, as circunstâncias da escrita de "O príncipe", que foi dedicado ao neto de Lourenço de Médici, o Magnífico.

- Ele (Anthony Grafton, autor da introdução) mostra que é uma obra que revela uma mudança de momento na história da Itália... A Itália levou o tempo inteiro se organizando e até hoje não conseguiu se organizar... - Pausa para os risos. - Não podemos falar, nós temos também nossos pecadilhos!

No prefácio do livro, FHC se aprofunda nas origens do maquiavelismo: "Como seus antecessores intelectuais, (Maquiavel) partiu do que é inerente ao ser humano. Não viu na natureza humana, entretanto, a vocação para o exercício do bem, senão que notou impulsos com motivações egoísticas. O interesse próprio, a ambição, a inveja, a vontade de domínio, motivam a ação dos homens...".

Dando apenas um gole d'água no parlatório, o conferencista complementa a originalidade do pensador italiano:

- Cada cidade da Itália tinha um sistema de governo diferente. Maquiavel viu tudo isso. O que ele talvez não tenha percebido é o fato de que as cidades italianas estavam desenvolvendo o capitalismo... Maquiavel não estava interessado em olhar a economia, mas estava interessado em como se exerce e mantém o poder. Aí ele inovou.

O ex-chanceler Machiavelli, acrescenta FHC, "rompe com os cânones de encarar a política". E prossegue: "Muita gente diz que ele entendeu o Estado, o que é um exagero. Mas a forma de governar, sim." Liberto dos fundamentos históricos, inicialmente jorrados nos alunos, o ex-presidente flutua em terreno mais amistoso: a inveja, a cobiça, o poder sem "maior transcendência do ponto de vista moral". Como esperado, ele salta alguns séculos e espelhos.

- Maquiavel mostra que quem exerce o poder quer mantê-lo - Leve interrupção. - Não é o caso meu, nem do Lula!

Por trás das palavras, inevitáveis paralelos entre Lula e FHC na exposição do ex-presidente sobre a virtù, o controle dos acontecimentos, e a fortuna.

- O homem de governo tem que se manter no poder. A sorte, a fortuna, que pode ser negativa, a má fortuna... Mas, se além da fortuna ele tem virtù, pode encarar a má fortuna... A pior situação na sociedade é a inexistência de poder.

A bondade.

- Ele não vai aconselhar o príncipe a ser mau, mas em circunstâncias excepcionais o dever do príncipe é não ser bom. O dever é manter-se no poder. Manda matar.

Os dois andares.

- Maquiavel sempre percebeu uma oposição entre quem manda e quem obedece, o príncipe e o povo... Mas esse povo não aparece com a virtù necessária para a mudança.

FHC cita Max Weber e Antonio Gramsci como pensadores que retomaram as ideias de Maquiavel, principalmente a respeito das diferenças entre a moral comum e a do príncipe. Tudo são memórias, e o ex-presidente se refere a "decisões agônicas":

- Às vezes, é necessário dissimular. Vou dar um exemplo pessoal. Um exemplo de todo presidente... O jornalista chega e pergunta: "Presidente, vai haver desvalorização do câmbio amanhã?". Você tem que dizer: "Não, o que é isso!". Aí, amanhã, você desvaloriza. Você tem que mentir, se não quebra o País.

A minutos do fim, sentencia:

- Maquiavel não foi maquiavélico. Não era de enganar, nem de se auto-enganar.

Na descida do palco, um sussurro para Luiz Schwarcz.

- Essa escadinha aqui é à prova de velhice.

Lygia Fagundes Telles o beija. A meio caminho, Eduardo Gianetti, coordenador do programa econômico de Marina Silva (PV) e autor de "Auto-engano", o cumprimenta:

- Parabéns pela palestra. Magnífica, como sempre!

FHC, o Magnífico, retribui:

- Generoso.

- Não, magnífica!

- Sempre que posso falo bem da Marina - avisa.

- Ah, presidente, ela é uma força oxigenadora da política, sem entrar em valorações morais... - ironiza Gianetti.

- Hoje não pode! Proibido por Maquiavel.

Dois engravatados reprovam a cena:

- Puxa-saquice...

"Ah, vocês!", diz FHC a três jornalistas. Agora é política, Serra e Lula sem a desculpa de Maquiavel. Ou nem tanto. Ataca o adversário petista:

- Maquiavel não justifica qualquer dissimulação.

Questionado sobre a ausência na campanha de José Serra (PSDB), FHC se desvia com elegância do que todos sabem se tratar de rejeição: "Não tenho energia". Terra Magazine pergunta como Lula está conduzindo as eleições em 2010.

- Não vou dizer como ele tem conduzido. Mas não fiz como ele faz. Ao se transformar em militante, está abusando, passa dos limites - critica. - O limite é a lei. A toda hora o presidente está sendo multado.

E o desafio de Lula, de que vai ensiná-lo a ser ex-presidente?

- Tô louco pra aprender. Ele disse que o ex-presidente não deve falar nada, só elogiar. Os ex-presidentes, a não ser o Itamar, só falam bem dele.

A jornalista Mona Dorf se aproxima com a filmadora.

- O senhor disse que a maior virtude do político é manter-se no poder...

FHC abre os caninos, num sorriso reprobatório de professor:

- Eu, não. Maquiavel! Não sou maquiavélico!

Outra vez sério, deixa o teatro com anotações sobre "O príncipe".

Fonte:Terra

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Nicolau Maquiavel e por causa das inexoráveis forças da História

Arrastadas pela inexorável corrente legislativa bruxelense, vêm de algum tempo a esta parte dando à costa notícias inusuais sobre a situação “insustentável” das praias concessionadas de Itália; sobre a tendência ucraniana de ir a banhos embriagado - o que constitui um grave risco para a segurança marítima – ou sobre a inevitável necessidade de transformar certas zonas da costa em luxuosos condomínios privados de forma a assegurar a necessária qualidade, segurança e “sustentabilidade” das praias.

Como habitualmente sucede, a Eurolei já está feita, de acordo com os interesses mais “representativos” (leia-se: os interesses banco-imobiliários daqueles que querem, finalmente, tomar posse de algumas regiões-pérola do litoral europeu, entre as quais, por óbvias razões geográficas e climáticas, algumas faixas “desocupadas” do extenso litoral português). Trata-se do culminar de uma batalha que há anos vem sendo travada, e que agora finalmente começa a dar os seus apetecíveis frutos. É claro que vale a pena perguntarmo-nos: como conseguiram os magníficos políticos e autarcas deste país descobrir essa região ignorada da Via Láctea donde viriam infindáveis clientes, da classe média e média-alta, para as centenas de “resorts”, a maioria dos quais dotados do indispensável campo de golfe, previstos na última década para o litoral português? Será que não se trata de um buraco negro da Galáxia, ao invés de um admirável mundo novo de clientes-maravilha?

Ora, a verdade seja dita: essa fase já passou. Agora trata-se de “vender a ideia” de que manter as praias com elevados níveis qualidade e segurança custa muito dinheiro; que o Estado é sinónimo de Défice, e que portanto ou pagamos nós (em vez “do Estado”, que nos é agora, pela primeira vez desde Nicolau Maquiavel e por causa das inexoráveis forças da História, absolutamente Exterior e Superior) ou ficamos sem o utilíssimo “Serviço do Ecossistema” (eufemismo recentemente introduzido pelos técnicos de biodiversidade das Nações Unidas, coadjuvados pelos seus homólogos da União Europeia, para servir o magno desígnio que consiste em enterrar o medievo princípio segundo o qual “O Sol quando nasce é para todos.” ). Qual quê, o Sol quando nasce, numa sociedade “moderna”, é para aqueles que o podem pagar!

A Europa, e em particular a do Sul, está pejada de arcaísmos – asseveram-nos os gurus. A bem ou a mal, temos de nos modernizar! Mas eis senão quando nos assalta o espírito o “modernismo” que é continuarmos a ser governados por gente tão vulgar, inculta ou semi-alfabetizada, formatada segundo as doutrinas do “mercado” e da “mão invisível” – as únicas de que ouviram falar, e que a bem dizer nunca perceberam – desde a Junta de Freguesia até ao G8, passando pelas empresas estratégicas “de Estado”, isto quando os infelizes “doutores” – que habitualmente até sabem algum inglês e percebem de computadores – saem das universidades directamente para o desemprego ou, quando não, para os mui modernos call-centers, caixas registadoras e part-times a 500 euros mensais). Para “modernizar” o sector do ambiente há pois urgentemente que começar a pagar os “Serviços do Ecossistema” (é o princípio do utilizador-pagador, lembram os gurus da minúscula economia).

Daí talvez o interesse recentemente expresso pelo “jovem” Passos Coelho em rever a arcaica Lei de Bases do Ambiente, aprovada nesse já longínquo anno de 1987. Mais um tango, dir-se-ia, enquanto o baile dura, pois as Leis maiúsculas a tal obrigam. Isso de o Sol continuar a nascer para todos é algo de que um futuro “moderno” e economicamente “eficiente” não se compadece, sob pena do insustentável agravamento do Défice e dos ratings da Dívida Soberana(!?) Não se trata pois apenas da sustentabilidade financeira do Serviço Nacional de Saúde e da Segurança Social, ou da “inadiável” reforma das leis laborais, matérias que, pela sua gravidade, requerem a dita “atenção” constitucional, e o dito Tango. O Ambiente é outro dos alvos, senão talvez mesmo o principal ou o primeiro, a atingir no curto e médio/longo prazos. Um alvo certo porque valioso e Tangível, ao contrário dos tradicionais alvos especulativos, aos quais a presente classe dirigente tanto deve. E comparativamente fácil, dada a “bovinidade” prevalecente no actual panorama ambientalista português (e não só).

Nisso consiste a “Deriva do Litoral”: na destruição do arcaico mas persistente conceito de “domínio público”, e na transformação do (muito) que ainda resta do litoral português em propriedades e domínios de gestão privada, porém devidamente servidos de segurança e infra-estruturas à custa, claro está, do eterno sujeito passivo que é o povo português. Tudo o que se disser diferente disto, usando as habituais técnicas do linguajar economês tecnocrático, não passa de música celestial, anunciando eternos “amanhãs que cantam” mas nunca chegam, e mantendo sempre em nós aquela ansiedade da tartaruga de Zenão, ou do Rio de São Pedro de Moel que, por mais que corram, nunca conseguem chegar a lugar nenhum. Acordai, escrevia o mestre Fernando Lopes Graça. Acordai antes que seja demasiado tarde. Antes que, daqui a nada,”tenhais de pagar bilhete, ou portagem, para poderdes ir a banhos”. Até porque, se houve aspecto em que os portugueses algo evoluíram desde 1974, e que em regra as câmaras municipais do litoral ajudaram a desenvolver, foi o da educação ambiental nas praias. Em matéria de limpeza, por exemplo, o estado de uma praia ao fim do dia não é hoje, de modo algum, comparável ao que podia ver-se há duas décadas atrás na maioria das praias portuguesas mais frequentadas. Pelo menos disso acho que podemos estar orgulhosos.


Fonte:dn.sapo

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Sala de aula: Maquiavel e a política

Na primeira das três vídeo-aulas sobre filosofia, o professor Ronaldo José Moraca, do Ético Sistema de Ensino, fala da obra de Nicolau Maquiavel e como as ideias contidas em O Príncipe são importantes, especialmente em ano de eleições.

Nos próximos programas, Moraca vai falar sobre Ciência e Ética. O objetivo é abordar assuntos que podem cair nos principais vestibulares e exames do País.

Os programas são fruto de uma parceria entre o Estadão.edu e o Ético Sistema de Ensino.
Para ver o video clique aqui

Fonte:estadao

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

FHC foi o Principe da Sociologia Brasileira

Em debate com o escritor britânico Salman Rushdie sobre o livro “O Príncipe”, na quinta-feira (5), o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) criticou o uso do paternalismo na política e disse esperar que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se torne um ex-mandatário que se mantenha em silêncio.

FHC e Rushdie conversaram em inglês por meia hora, no centro de Paraty, palco da Flip (Feira Literária Internacional) em ato de promoção de nova edição do livro de Nicolau Maquiavel (1469-1527) lançada pelo selo Penguin Companhia.

O ex-presidente, autor do prefácio da nova edição, procurou contextualizar o livro, lembrando que foi escrito à época de formação dos Estados nacionais, citando que, para Maquiavel, a política se explicava pelas ambições, forças e fraquezas humanas.

O ex-presidente comentou, em tom irônico, que o objetivo de quem estava no poder era manter-se no poder.

- Hoje há eleições, isto não é mais possível. Mas há quem queira ficar.

Rushdie definiu como “republicana” a tradição nos Estados Unidos de ex-presidentes manterem-se em silêncio. Fernando Henrique, sorrindo, interrompeu e comentou o que espera de Lula quando sair do poder:

- Sou um ex-presidente que não fala. O Lula também acha que ex-presidente não deve falar. Estou esperando...

Bem-humorado, o ex-presidente lembrou que Maquiavel era um servidor público, defensor da República de Florença e afirmou que não há como o compararem com o escritor italiano e fez piada sobre o apelido dado por amigos de “príncipe da sociologia brasileira”:

Eu fui um príncipe; ele, não.

FHC novamente negou que tenha dito uma frase que a Folha de S.Paulo publicou como sua, após reunião com empresários e reclamou:

- Nunca disse 'esqueçam o que eu escrevi', mas isso é repetido até hoje. Fui obrigado até a escrever um livro com o título 'Lembrando o que Escrevi.'

O ex-presidente ainda reclamou que em política tenta-se julgar não os atos de um governante, mas suas supostas intenções.

O ex-presidente criticou, em uma declaração indireta em Lula, governantes que exploram a imagem de “pai dos pobres”.

- Não é democrático.
Fonte:R7

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Felipão é intocável no Palmeiras?

Não seria difícil prever o tratamento diferenciado que Luiz Felipe Scolari recebe hoje de jogadores, dirigentes e da própria mídia. Fosse outro, com esse desempenho meio sem sal do Palmeiras na retomada do Campeonato Brasileiro (está há quatro jogos sem ganhar) e já veria, não digo o mundo cair sobre sua cabeça, mas, pelo menos, uma intensa formação de nuvens bastante carregadas na linha do horizonte. Cúmulos nimbos, como dizem os meteorologistas.


Não. Scolari segue tranquilo, surfando em popularidade. Aquele mesmo Ibope que o dava como favorito para assumir a seleção brasileira, à frente de Muricy e Mano. Sejamos justos. Felipão tem história para justificar essa benevolência. Campeão da Libertadores da América pelo Palmeiras, campeão do mundo em 2002, ótimo trabalho na seleção portuguesa, além de uma simpatia meio brusca, que passa credibilidade ante a opinião pública. É currículo.

Luiz Felipe não é uma celebridade vazia. Tem conteúdo. Mas é uma celebridade. E, no mundo atual, às celebridades tudo é permitido, ou quase tudo. Às celebridades, se pede que existam, se exibam e basta. No futebol, o buraco pode ser mais embaixo. De qualquer forma, ele tem um capital de popularidade de que nenhum outro técnico no Brasil dispõe. Apesar do começo tímido, mal começou a gastá-lo. E talvez logo seja recompensado pelos resultados, quando então poderá não apenas deixar de dilapidar o patrimônio como talvez aumentá-lo ainda mais.

Há motivos para pensar assim. De um lado, a competência técnica de Felipão. De outro, os jogos, este último em particular. O Palmeiras, embora não tenha vencido o Corinthians, jogou bem. Não sendo favorito, pois o Corinthians tem mais estrutura como time, o Palmeiras igualou as ações depois de ser dominado até tomar o gol. Poderia muito bem ter vencido a partida. Qualquer um dos dois, aliás, poderia ter levado a melhor nesse clássico tão igual. Por fim, devem chegar ao Palmeiras os tais reforços, para dar mais caldo ao cozido do chefe.

Mas não é isso que quero discutir e sim o limite da imunidade de algumas estrelas. Duas delas - Luxemburgo e Muricy - conheceram recentemente a cor do bilhete azul. E ambos no mesmo Palmeiras que hoje abriga Felipão. Quando foram demitidos o time ia mal, mas não em situação extrema, ameaçado, por exemplo, de ir parar na Segunda Divisão. Acontece que talvez não tenham se adaptado tão bem à nova política do Parque Antártica, sempre tão confusa e sinuosa que desnortearia um mestre da matéria como Nicolau Maquiavel. O Parque, com suas alamedas cheias de sussurros, teria mistérios mesmo para o florentino, autor de O Príncipe, esse clássico sobre a arte de governar em tempos difíceis. Tanto Muricy como Luxemburgo aparentemente foram devorados pelas intrigas palacianas de uma prosaica turma do amendoim.

Caíram como comuns mortais, embora façam parte do seleto clube dos intocáveis. Na verdade, Muricy já havia saído contra a vontade do São Paulo, isso depois de ser tricampeão brasileiro no Morumbi. Prova de que existem limites de durabilidade do material, mesmo para os mais badalados entre todos.

Vanderlei Luxemburgo é um que está sendo posto à prova em sua couraça de celebridade. Coleciona maus resultados no Atlético Mineiro e vê seu time vegetar na indesejável zona de degola. Domingo Luxa saiu vaiado de campo, depois de mais uma derrota do Atlético, desta vez para o arquirrival Cruzeiro. "Coisas da vida", ele comentou. Mas deve ter pensado quanto ainda poderá resistir a uma campanha dessas.

A condição de celebridade pode blindar o treinador durante algum tempo. Ou mesmo durante muito tempo. Não para sempre.


Fonte:estadao

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Maquiavel é guia perfeito para interpretar os poderosos

É irresistível ler (ou reler) "O Príncipe", de Nicolau Maquiavel (1469-1527), e não relacionar fatos do cotidiano da política com a obra iniciada pelo florentino em por volta de 1513.
A influência renascentista e as guerras entre Estados de uma Europa em formação são fatos usados como o plano de fundo desse guia das relações entre poderosos e governados. Astúcia, ambição, crueldade e virtude são analisadas sob o prisma de quem está e deseja ficar no comando.
Tome-se o caso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista conduz muitas de suas ações conforme recomendaria o antigo escritor. Não há em "O Príncipe" nada similar, ou que remeta ao Bolsa Família. Mas o maior programa social do nosso atual presidente, certamente se encaixa na categoria clássica de benemerências recomendadas por Maquiavel:

"Os benefícios devem ser feitos aos poucos, para que sejam mais bem saboreados". O Bolsa Família é assim: atinge todos os meses a 12,5 milhões de pessoas.
Houve também um certo lulo-maquiavelismo no início do governo petista (2003). Manteve-se a taxa de juros nas alturas. Deu-se preferência à estabilidade da economia em detrimento do crescimento do país.

Como está recomendado em "O Príncipe", o mal foi feito de uma vez: "A crueldade bem empregada - se é lícito falar bem do mal - é aquela que se faz de uma só vez, por necessidade de segurança".

O livro acaba de ser relançado pela Cia. das Letras. Chega com tradução atualizada assinada por Maurício Santana Dias. O prefácio é de Fernando Henrique Cardoso. E a nova edição do livro está sendo avaliada como ótima.

Há também a introdução de Anthony Grafton, professor de história europeia, com fartas notas de rodapé, cronologia e um glossário. FHC retoma no livro um de seus debates prediletos: a diferença entre a ética da responsabilidade (do político) e a ética do cidadão comum.

O governante não pode "cingir-se a respeitar valores absolutos", escreve ele. Por essa lógica, um político fracassará se assumir o Planalto recusando-se a conversar com a escória que muitas vezes transborda do Congresso. FHC e Lula aprenderam a enfrentar essa vicissitude da política.

É uma boa coincidência o relançamento de "O Príncipe" agora, a pouco mais de dois meses para a eleição. Bastante útil para políticos, a obra de Maquiavel também serve à perfeição como guia para eleitores interessados em interpretar o comportamento desses poderosos do Brasil.

Fonte:diariodovale

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Ao falar sobre Maquiavel, FHC ironiza os que querem ficar no poder

A premissa do encontro era discutir uma nova versão do clássico O Príncipe, de Nicolau Maquiavel, recém lançada pela Companhia das Letras e paixão comum dos dois debatedores. Mas o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o escritor inglês de origem indiana Salman Rushdie aproveitaram hoje, 5, para ironizar a própria política, durante um rápido debate em Paraty, à parte da programação da 8ª Festa Literária Internacional.

"O objetivo do príncipe no romance é a manutenção do poder. Isso não se aplica mais. Hoje temos eleições - embora ainda existam pessoas interessadas em permanecer", disse Fernando Henrique, arrancando gargalhadas de uma pequena mas seleta plateia, formada tanto por fãs como por empresários e banqueiros.

Aplaudido ao chegar à casa utilizada pela editora como sua sede em Paraty, o ex-presidente apresentava-se mais relaxado que na noite anterior, quando fez a palestra de abertura da Flip, sobre a obra de Gilberto Freyre, diante de quase mil pessoas. "Ele e Maquiavel não são comparáveis, pois Freyre diminuiu o valor do poder político do Estado", disse o sociólogo, autor do prefácio da nova edição de O Príncipe.

Depois de ouvir um irônico comentário de Rushdie sobre ex-presidentes americanos ("Todos, nessa condição, ficam mudos"), Fernando Henrique disse que tenta manter a mesma postura e que vai cobrar isso de seu sucessor. "Lula disse que vai se calar. Vamos esperar para ver."

Durante seus oito anos de mandato presidencial, Fernando Henrique disse que procurou alertar os historiadores para se preocuparem com fatos e não intenções. "Muitas vezes, não estamos ainda bem certos do que fazer", disse. "Não podemos ser julgados por isso." E arrematou: "Eu não posso me comparar com Maquiavel. Eu fui um príncipe. Ele, não".

Fonte:Gaz.com

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Uma vila para Felini

Cinema e literatura da Itália ganham espaço, neste mês, em São Caetano. A Villa della Cultura, ‘instalada'' no Museu Histórico Muncipal, oferece de hoje até dia 29 uma programação especial, com destaque para a mostra de filmes de Federico Fellini (1920-1933).

Esta é, na verdade, uma das atrações da 18ª Festa Italiana da cidade. Enquanto o evento em frente à Igreja Matriz traz a gastronomia e a música do país da bota - de onde vieram os fundadores de São Caetano -, a Villa della Cultura ocupa o museu, no mesmo bairro Fundação.

Um espaço literário disponibiliza livros de autores e temas da cultura italiana. A intenção é criar uma área de leitura no local, com direito a café. As obras são do acervo das bibliotecas municipais - não serão feitos empréstimos de livros. Entre os mais de 40 títulos estão A Ilha do Dia Anterior, de Umberto Eco, Dicionário dos Sobrenomes Italianos, de Ciro Mioranza, e O Príncipe, de Nicolau Maquiavel.

Aos domingos, a partir das 18h30, as luzes se apagam, e a Villa é toda de Fellini. A mostra (veja programação abaixo) traz quatro clássicos do diretor italiano: A Estrada da Vida (1954), Os Boas-Vidas (1953), 8 e Meio (1963) e A Doce Vida (1960). Este último é considerado a obra-prima de Fellini e também um dos maiores filmes da história do cinema, com Marcello Mastroianni como protagonista. Os ingressos, que são gratuitos, serão distribuídos com uma hora de antecedência. O local vai ganhar decoração de cinema de época.

Os visitantes da Villa poderão também entrar em um carro antigo feito de madeira, montado em uma das salas do museu, e ‘viajar'' através de um vídeo com imagens e animações sobre importantes acontecimentos da história do município, desde sua fundação até os dias atuais. Os registros foram pesquisados por historiadores da Fundação Pró-Memória.

Para atrair o público da Festa Italiana ao Villa della Cultura, um casal de atores, trajados como imigrantes italianos, vai circular entre as barracas convidando ao espaço cultural. As pessoas poderão ainda tirar fotos com trajes de época.


Programação

Mostra de Cinema Italiano
Especial Fellini

Amanhã
A Estrada da Vida (100 min.)

Dia 15
Os Boas Vidas (89 min.)

Dia 22
A Doce Vida (167 min.)

Dia 29
8 e Meio(145 min.)

Sempre às 18h30

No Museu Histórico Municipal de São Caetano - Rua Maximiliano Lorenzini, 122.
Tel.: 4229-1988

Entrada franca